Os
juízes da Corte Eleitoral, em sessão ordinária na tarde de hoje (22),
decidiram por unanimidade, julgar procedente ação de perda de cargo
eletivo por desfiliação partidária, interposta pelo Ministério Público
Eleitoral, que pretendia o reconhecimento de infidelidade por parte do
prefeito de Caraúbas, Ademar Ferreira da Silva.
Nos autos do
processo 837-11.2011, o peticionado argumentou que sua desfiliação do
Partido Social Brasileiro (PSB) decorreu de grave discriminação
pessoal, caracterizada por divergências partidárias, impossibilitando
assim a sua permanência no partido.
Em seu voto, o juiz Jailsom
Leandro, relator, primeiramente destacou que a jurisprudência do TSE e
do próprio Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte entende
que as divergências partidárias não configuram a grave discriminação
pessoal, implicando assim, a não justa causa para desfiliação
partidária. Além disso, verificou que houve desentendimentos entre o
peticionado e o PSB, quanto à indicação do partido para a disputa da
legenda nas eleições de 2012, uma vez que a candidatura era desejada
tanto por Ademar Ferreira quanto pela presidente do partido. O
magistrado entendeu que existiu divergências partidárias, mas não de
discriminação pessoal e política de natureza grave, votando procedente
pela perda do mandato de Prefeito outorgado a Ademar Ferreira da Silva.
Os demais juízes acompanharam o relator integralmente.
Após a
publicação do acórdão, no Diário da Justiça eletrônico (DJe), o TRE
fará a comunicação oficial à Câmara Municipal de Caraúbas a fim de que
seja empossado seu substituto.
Leia abaixo, na íntegra, o voto do relator do processo, juiz Jailsom Leandro.
VOTO
Submetida a matéria à apreciação do STF nos julgamentos dos Mandados de
Segurança nº 26.602 , 26.603 e 26.604 , esse Tribunal entendeu
aplicável o princípio da fidelidade partidária e determinou que o TSE
regulamentasse o processo para decretação da perda do mandato eletivo
daquele que violasse o referido princípio.
Destaque-se que nos mencionados julgados, o STF previu as
hipóteses em que se legitimaria o voluntário desligamento partidário,
sem que disso decorresse a necessária perda do mandato eletivo ocupado.
Nesse contexto, o TSE editou a Resolução n.º 22.610/2007, por
meio da qual disciplinou o processo de perda de mandato eletivo e o de
justificação de desfiliação partidária.
Previu, no artigo § 1º do art. 1º as hipóteses que caracterizam
justa causa para a desfiliação partidária: I) incorporação ou fusão de
partidos; II) criação de novo partido; III) mudança substancial ou
desvio reiterado do programa partidário; e IV) grave discriminação
pessoal.
No caso presente, aduz o peticionado que sua desfiliação
decorreu de grave discriminação pessoal, caracterizada por divergências
partidárias e por impossibilidade de ele permanecer no partido.
A jurisprudência do TSE e deste TRE é no sentido de que meras
divergências partidárias não configuram a grave descriminação pessoal
que caracteriza justa causa para desfiliação partidária.
Impõe-se verificar, pois, se a situação reportada nos autos
caracteriza mera divergência partidária ou discriminação pessoal que,
além de ser grave, deve ser de natureza política ou com potencial para
produzir efeitos políticos.
Inicialmente, registro que o ônus da prova de que existiu justa
causa para a desfiliação é do peticionado, pois a ele cabe a
comprovação da existência de fato extintivo, impeditivo ou modificativo
do direito de o partido originário postular a perda do cargo
(interpretação do art. 8º da Resolução nº 22.610/2007). Ademais,
descabe impor ao peticionante o ônus da produção de prova negativa
(provar que inexistiu justa causa).
Apreciando a prova constante dos autos, em especial ouvindo e
vendo os depoimentos pessoais, verifiquei que os desentendimentos que
resultaram no pedido de desfiliação dizem respeito à indicação do
partido para a disputa ao cargo de Prefeito nas eleições de 2012. Pois,
enquanto o peticionado pretende a legenda para disputar a reeleição, a
presidenta do partido deseja ser a candidata, afirmando inclusive que
já era para tê-lo sido na eleição passada, quando se acabou indicando o
peticionado, seu tio, por ter ela incorrido em dupla filiação
partidária.
Consta dos depoimentos que a presidenta teria afirmado que no
partido quem manda é ela, que ela teria resistido a marcar reuniões
partidárias solicitadas pelo peticionado e que teria discutido
gravemente com ele em reuniões políticas informais com os membros do
Diretório que a apoiam, para as quais não o convidou.
Sentindo sua pretensão de candidatura ameaçada, o peticionado
requereu sua desfiliação a tempo de poder disputar a eleição por outro
partido.
Tenho entendido que a desfiliação partidária está justificada
quando o detentor de mandato eletivo não tem perspectivas mínimas de
obtenção de legenda no partido em que se encontra por divergências com a
direção, estando esta em situação de verdadeiro caciquismo evidenciada
pela impossibilidade real de disputa partidária. Em tais situações, em
que há verdadeiro risco de morte política, não seria razoável impor a
permanência do detentor de mandato no partido, estando caracterizada
situação de estado de necessidade a justificar a desfiliação.
No caso presente, porém, não é essa a situação que se apresenta,
eis que não há uma diferença de forças entre a presidenta do partido e
o detentor de mandato que se retira a evidenciar uma situação de
opressão em que os destinos estariam traçados, sem qualquer
possibilidade de obtenção da legenda. Ele, prefeito municipal, detém,
pelo cargo que ocupa, uma relativa força política que pode se opor à
direção partidária e, em convenção, disputar a indicação. A situação
concreta não evidencia estado de necessidade justificadora da
desfiliação, segundo o meu entendimento, mas apenas conveniência
política de evitar o risco de perder na convenção, em face da
existência de divergências partidárias.
Caracterizada, no caso, existência de divergências partidárias,
mas não de discriminação pessoal e política de natureza grave, eis que,
permanecendo no partido, o peticionado poderia participar da convenção
e nela disputar a indicação com alguma chance.
Diante do exposto, por não estar caracterizada justa causa para a
desfiliação partidária, julgo procedente o pedido e decreto a perda do
mandato de Prefeito do Município de Caraúbas-RN outorgado a Ademar
Ferreira da Silva.
É como voto.
Natal, 22 de maio de 2012.
Juiz JAILSOM LEANDRO DE SOUSA
Relator
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